IDEAIS TRAÍDOS - sylvio frota - 706 Págs

(EROCHA) #1

como líder o senador Passarinho. Não admitiria pressões.


Repeli, logo, a insinuação de desígnios políticos, numa cerimônia estritamente militar,
assegurando-lhe que os méritos e a imagem do senador, apreciados na sua Arma de origem,
elucidavam bem a seleção. Eu tinha concordado e visto com bastante agrado aquela delicada
homenagem à nossa reserva. Iria procurar uma solução para evitar fosse o caso explorado e desse
origem a aborrecimentos, que, em última análise, enfrentaria.


Os intrigantes e politiqueiros que freqüentavam o palácio do Planalto, num ritmo de segundos,
tinham criado mais um problema para o Ministro do Exército. Estava obrigado, por dever de
lealdade, a preservar a participação do Presidente da República na recusa do nome do senador
Passarinho; não podia nem devia arranhar susceptibilidades de meus companheiros e comandados
que, espontaneamente, entre muitos oficiais, optavam por seu colega da reserva; finalmente, seria
quase um insulto desfazer o convite, tão honrosamente aceito pelo senador Passarinho, sem ferir-lhe
a dignidade e submetê-lo a um vexame.


Mandei chamar o general João Gomes e disse-lhe que, inexplicavelmente, haviam surgido
restrições à escolha de um oficial da reserva para panegirista de Mallet, existindo quem preferisse
um general da ativa. Temia se avolumassem as discordâncias, o que eu não desejava e seria mui
desagradável. Pedia-lhe, portanto, que procurasse o senador Passarinho e lhe expusesse este novo
aspecto das ocorrências.


O general João Gomes estranhou a notícia, pois nada ouvira a respeito. Sentiu que deveria
esconder-se, por trás daquela informação, algo de grave cujo sigilo impunha-se. Trocamos algumas
palavras, com o objetivo de esclarecer a missão, e o general partiu para cumpri-la.


Não posso precisar quando - se no mesmo dia ou no posterior - o general João Gomes entregou-
me uma carta do senador Passarinho, declinando do convite. Do documento, redigido com elevação
moral e elegância, aflora a inteligente percepção das verdadeiras causas das restrições. Tenho-o em
meus arquivos' e dele me permito destacar o seguinte trecho: "Refletindo melhor, agora, diante do
próprio vulto que a notícia, uma vez publicada, tomou em todo o Brasil, sinto que a minha imagem
política está sobrelevando a imagem militar e afetando, por conseguinte, a própria natureza do
convite que tanto me sensibilizou."


Escolhido outro orador, sossegou o palácio do Planalto. Não posso, no entanto, deixar sem
referência a nobre atitude do senador Passarinho, evitando um atrito, que já se esboçava, entre o meu
assentimento e a rejeição desarrazoada - opressiva como todos os seus atos - do presidente Geisel.


Mais tarde, em 1977, na fase de intensa agitação política na luta por cargos nos estados, quando
as acomodações e conchavos sopitavam a dignidade em concessões de todos os tipos, deparei-me,
ao ler os jornais de Brasília, com uma notícia estranha. Estampava o matutino uma fotografia do
encontro que tinham tido dois importantes chefes políticos do estado do Pará. Ambos sorridentes,
ainda que aparentemente constrangidos, selavam, com um aperto de mãos, a conciliação da política

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