Neste quadro de apreciações, como resultado de hábeis conversações entre o nosso Estado-
Maior do Exército e os membros da missão norte-americana, surgiu a proposta, de iniciativa desta
missão, da venda do material aqui existente. Pediram determinada quantia que julgamos exagerada.
Contrapusemos uma oferta que não foi aceita, entretanto, após estas especulações, chegamos à
concordância sobre um preço - na realidade simbólico - de 300 mil dólares, o que perfazia um total
de quase quatro milhões de cruzeiros.
Concretizamos a aquisição nos primeiros dias de março, libertando-nos da incômoda situação de
responsáveis por considerável quantidade de material bélico que não nos pertencia. Estávamos,
assim, livres das periódicas visitas dos oficiais americanos para "conhecer o estado do material".
Poucos dias depois estoura a questão do Relatório Americano.
O assunto, pela gravidade de que se revestiu, merece apreciações mais profundas e extensas,
visando a melhor elucidá-lo, naturalmente, nos limites de meu conhecimento.
Os empréstimos e concessões de recursos, sob estas ou qualquer outra denominação, feitos pelos
Estados Unidos a outros países, dependiam, de acordo com lei norte-americana de 1976, da
aprovação pelo Legislativo daquele país. Entre os documentos exigidos para apreciá-los estava um
relatório, elaborado pelo Executivo norte-americano, sobre a situação interna do país beneficiado. A
lei estabelecia que nenhuma ajuda - de qualquer espécie - fosse concedida sem a satisfação desta
exigência. O fulcro desta orientação era a política dos Direitos Humanos que o presidente Jimmy
Carter defendia com obstinação religiosa.
Em que pese todo o elogiável sentimento humanitário dessa política, não se pode fugir à ilação
de que tinha, e tem, nítido caráter intervencionista. Realçava-se nela a arrogância norte-americana de
interferir nos assuntos internos dos outros países, provocando reações e cancelamentos de programas
de ajuda, pois, por mais tolerante que seja um governo, não se fustigam os brios nacionais de um
povo sem uma resposta altiva e adequada à afronta.
Era, e é, uma política ingênua porque se restringia este controle apenas aos países que, de uma
maneira ou doutra, vegetavam na órbita de influências norteamericanas.
As nações que não recebiam ajuda dos Estados Unidos e as semi-independentes, que
perambulavam na faixa de domínio soviético, estavam livres desta fiscalização.
Os russos olhavam com maior descaso este procedimento norte-americano que devassava a vida
interna, justamente, dos países seus amigos. Isto permitialhes intensificar a propaganda marxista
através das vulnerabilidades conhecidas. O desprezo com que Yuri Andropov,2 chefe da KGB -
Comitê da Segurança do Estado - aludiu, mais tarde, em 1979, à Política dos Direitos Humanos está
patente quando declarou, consoante notícias da imprensa, que sua instituição não persegue os
defensores dos direitos humanos, mas somente fiscaliza "as atividades criminosas dos renegados,
porque estes renegados são condenados por todo o povo soviético" e, logo a seguir, "proteger a