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enológicas na formação das características de um
vinho. Em 2002, um dos enólogos mais contro-
versos dos Estados Unidos, Randall Grahm, ques-
tionou: “O terroir está morto? De repente, essa
é a questão. Talvez porque estejamos sentindo a
dor de sua ausência. Estamos sentindo sua perda.
Sem terroir, a produção de vinho é um jogo va-
zio, uma sala de espelhos”.
Na época, o experiente enólogo Paul Draper
já explicava que “um enólogo tem que estar mui-
to concentrado em fazer com que o local forneça
o caráter básico do vinho, e não em algo que ele
faça”. “Se o terroir vai ser expresso, então o enó-
logo tem que deixar o vinho mais ou menos se
fazer”, afirmou.
Aos poucos, a tendência de vinhos opulentos
e o uso intenso da madeira, especialmente nova,
foi sendo deixado para trás. “A madeira é um fator
que padroniza bastante os vinhos. Com ela, não
tem sentido essa busca de terroirs”, afirma a enó-
loga chilena Johanna Pereira. “Ao se padronizar,
mata-se o vinho. Fazer o vinho para o mercado é
uma bobagem. Fazer o vinho para os consumido-
res significa perder a alma. Quando falamos de
vinhos de terroir, é preciso fazer as coisas de for-
ma mais autêntica. Não se deve notar a mão de
alguém. Isso é ir contra o conceito de um grande
vinho”, defende o italiano Alberto Antonini, um
dos mais prestigiados enólogos do mundo.
Mas e quando as produções são em grande es-
cala, é possível revelar algo do terroir? Segundo
a enóloga Rosemary Cakebread, não. “Quanto
maior o volume de vinho, mais diversificado é o
blend, e quanto mais você mistura, mais você tira
o local da foto. É como um comitê: quanto mais
pessoas envolvidas, mais genérica é a decisão. Por
outro lado, quanto menor o vinhedo, mais você
vê a marca, o caráter real de um determinado pe-
daço de terra”, revela.
A partitura do terroir
Um dos maiores especialistas em terroir da Amé-
rica do Sul, o chileno Pedro Parra, apelidado de
“Sr. Terroir”, afirma que há algumas variáveis im-
portantes na hora de encontrar o local adequado
para produzir um determinado tipo de vinho. Se-
gundo ele, é preciso levar em consideração con-
não há terroir. Sem homens, haveria apenas ter-
ritórios não descobertos. O solo tem seu próprio
potencial e meu trabalho é revelar essa potencia-
lidade. O know-how utilizado na vitivinicultura
leva à originalidade como expressão única, estilo
único, não se pode fazer cópias, e também à tipi-
cidade como reconhecimento do produto e reco-
nhecimento da habilidade humana”.
Visão interessante também tem o enólogo
Sebastián Zuccardi: “Não há lugar sem gente e
não há gente sem lugar. É muito importante a
intepretação de quem faz o vinho. E cada vinho
tem que contar três histórias: a história do lugar,
a história do produtor e a história do ano”. Ele diz
que, quando mais jovem “queria fazer um vinho
em que não se notasse a minha presença”. “E isso
é impossível, porque ou cultivamos a vinha, ou a
manejamos. Este vinho é a expressão deste lugar
através deste produtor”, afirma.
Homem matou o terroir?
Há alguns anos, quando a indústria do vinho pa-
recia cada vez mais focada em um estilo de vinho
para conquistar paladares de consumidores que
estavam influenciados pelo estilo “Robert Paker”,
uma questão foi posta: “o terroir está morto?”
Muitos, principalmente na indústria norte-
-americana, chegaram a bater de frente com a
participação cada vez mais decisiva das técnicas
“Não há lugar
sem gente e não
há gente sem
lugar. É muito
importante a
intepretação
de quem faz o
vinho”
Sebastián Zuccardi
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