matias

(Zelinux#) #1
REFLEXÕES SÔBRE A VAIDADE DOS HOMENS

rações, e todos os tributos; na mesma tumba, em que
se apaga a luz, também se extingue o aplauso; na
mesma sombra, em que se encobre o dia, também se
esconde o obséquio; e o respeito acaba nas mesmas
ondas, em que faz naufrágio o sol.


Sucede muitas vêzes mudar o amor, primeiro (106) que a
formosura mude; isto dizem que faz o amor ingrato; porém a
mudança quase sempre é culpa da beleza, e não do amor.
Naturalmente a formosura é soberba, vaidosa, ímpia, e
arrogante; não só re-fusa, mas despreza; não só desdenha, mas
injuria. Um objeto amável basta para produzir amor, mas não
basta para o conservar; o amor nasce fàcil-mente, mas dura
com dificuldade; porque o império da beleza sempre foi
tirano, e sem brandura, não há domínio permanente. O amor é
ato de um movimento repentino; a conservação dêle vem por
discurso, por isso a primeira coisa é fácil, e dificultosa a outra.
Não há encanto perpétuo; o do amor também tem fim, e
enquanto dura, é por intervalos; e ainda que o amor seja
pronto, e arrebatado em conquistar, por isso mesmo nada tem
seguro; porque o que se toma precipitadamente, precipitada-
mente se larga; daqui vem que um moderado amor costuma
ser durável; o que é excessivo, a sua mesma violência o acaba;
a tormenta forte nunca dura. Mas não sei se pode haver
moderação no amor. Há muitas coisas, em que a moderação é
contrário à natureza delas; e em que a abstinência custa menos
do que o uso limitado. O amar uma coisa só parece que é mais
penoso, que o não amar nada; porque com efeito o abster é
menos dificultoso, que o conter ; por isso a prisão de algum
modo molesta menos,
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