matias

(Zelinux#) #1
MATIAS AIRES RAMOS DA SILVA DE EÇA

mesmo impulso; a formosura, pelo que sente sabe o
que faz sentir; e pelo que se ama, conhece que se faz
amar; daqui vem que a vaidade, e a altivez, são partes
de que a formosura se compõe; a mesma tirania, e
rigor atrai: e que haverá na formosura, que não sirva de
laço, de prisão, de amor?

(112) É propriedade do amor o ser violento; e é pro-
priedade da violência o não durar. O amor acaba-se em
nós, não por nossa vontade, mas porque tem por
natureza o acabar; e ainda que tudo há de acabar
conosco, nem tudo espera por nós. Quando amamos, é
por fôrça, porque a formosura que nos inclina, nos
vence; e também é por fôrça quando não amamos;
porque uma vez rotos os laços, ficamos de tal sorte
livres, que ainda que queiramos, não podemos tornar a
êles; e assim não está na nossa mão o não amar, nem
também o amar: o coração por si mesmo se acende, e
entibiece; nós, não o podemos inflamar, nem extinguir-
lhe o ardor: aleguem os amantes êsses mesmos ardores
indiscretos; façam dêles merecimento para o favor;
imaginem embora, que os soluços e gemidos, fazem ser
devida a recompensa; exagerem penas, e martírios, e
finalmente tenham a ventura de que uma beleza tímida,
inocente, e incauta, creia que verdadeiramente está
obrigada, e que deve atender, e corresponder: ambos se
enganam; o amante em supor que por amar, merece; e a
beleza em crer, que o amor é merecimento: não é tal;
porque o amor vem da formosura, e não do amante;
êste não faz mais que receber uma impressão a que não
pode resistir: nada merece um bronze, por receber em
si a figura de uma Vênus; a maravilha não está no
bronze, que

Free download pdf