objetivos e são cegas para tudo o mais. Desse modo, quanto mais racionais forem as regras de sua
ação individual tanto menos tais regras serão respeitosas do entorno econômico, social, político,
cultural, moral ou geográfico, funcionando, as mais das vezes, como um elemento de pertubação e
mesmo de desordem. Nesse movimento, tudo que existia anteriormente à instalação dessas
empresas hegemônicas e convidado a adaptar-se às suas formas de ser e de agir, mesmo que
provoque, no entorno preexistente, grandes distorções, inclusive a quebra da solidariedade social.
Competitividade versus solidariedade
Pode-se dizer então que, em última análise, a competitividade acaba por destroçar as
antigas solidariedades, freqüentemente horizontais, e por impor uma solidariedade vertical, cujo
epicentro é a empresa hegemônica, localmente obediente a interesses globais mais poderosos e,
desse modo, indiferente ao entorno. As solidariedades horizontais preexistentes refaziam-se
historicamente a partir de um debate interno, levando a ajustes inspirados na vontade de reconstruir,
em novos termos, a própria solidariedade horizontal. Já agora, a solidariedade vertical que se impõe
exclui qualquer debate local eficaz, já que as empresas hegemônicas têm apenas dois caminhos:
permanecer para exercer plenamente seus objetivos individualistas ou retirar-se.
Como cada empresa hegemônica no objetivo de se manter como tal deve realçar tais
interesses individuais, sua ação é raramente coordenada com a de outras, ou com o poder público, e
tal descoordenação agrava a desorganização, isto é, reduz as possibilidades do exercício de uma
busca de sentido para a vida local.
Cada empresa hegemônica age sobre uma parcela do território. O território como um
todo é objeto da ação de várias empresas, cada qual, conforme já vimos, preocupada com suas
próprias metas e arrastando, a partir dessas metas, o comportamento do resto das empresas e
instituições. Que resta então da nação diante dessa nova realidade? Como a nação se exerce diante
da verdadeira fragmentação do território, função das formas contemporâneas de ação das empresas
hegemônicas?
A palavra fragmentação impõe-se com toda força porque, nas condições acima
descristas, não há regulação possível ou esta apenas consagra alguns atores e estes, enquanto
produzem uma ordem em causa própria, criam, paralelamente, desordem para tudo o mais. Como
essa ordem desordeira é global, inerente ao próprio processo produtivo da globalização atual, ela não
tem limites; mas não tem limites porque também não tem finalidade e, desse modo, nenhuma
regulação é possível, porque não desejada. Esse novo poder das grandes empresas, cegamente
exercido, é, por natureza, desagregador, excludente, fragmentador, seqüestrando autonomia ao resto
dos atores.
Os fragmentos resultantes desse processo articulam-se externamente segundo lógicas
duplamente estranhas: por sua sede distante, longínqua quanto ao espaço da ação, e pela sua
inconformidade com o sentido preexistente da vida na área em que se instala. Desse modo, produz-
se uma verdadeira alienação territorial à qual correspondem outras formas de alienação.
Dentro de um mesmo país se criam formas e ritmos diferentes de evolução, governados
pelas metas e destinos específicos de cada empresa hegemônica, que arrastam com sua presença
outros atores sociais, mediante a aceitação ou mesmo a elaboração de discursos “nacionais-
regionais” alienígenas ou alienados.