Chomsky_Noam_-_lucro_ou_as_pessoas

(mariadeathaydes) #1

a República Tcheca para desfrutar de proteção semelhante, recolhendo os lucros e deixando o
governo com os custos. A Dairnler-Benz pode fazer arranjos do mesmo tipo no Alabama. O capital
pode se mover livremente; os trabalhadores e as comunidades ficam com as conseqüências. Ao
mesmo tempo, o gigantesco crescimento do capital especulativo não regulado impõe pesadas
pressões sobre as políticas governamentais de estímulo à produção.
Muitos fatores estão empurrando a sociedade global em direção a um futuro de baixos
salários, baixo crescimento e elevados lucros, com polarização f desintegração social crescentes.
Outra conseqüência é o esmorecimento dos processos democráticos significativos, à medida que a
tomada de decisões é transferida às instituições privadas e estruturas para-governamentais que se
vão aglutinando à sua volta, aquilo que o Financial Times chama de “governo mundial de fato”, que
opera em segredo e não tem nenhum controle público.
Esses desenvolvimentos têm muito pouco a ver com o liberalismo econômico, um conceito de
limitada significância num mundo no qual uma vasta parcela do “comércio” consiste de transações
intra-empresas, centralmente administradas (metade das exportações norte-americanas para o
México antes do NAFTA, por exemplo – “exportações” que nunca chegaram a entrar no mercado
mexicano). Ao mesmo tempo, o poder privado exige e recebe, como no passado, proteção estatal
contra as forças do mercado.
“Os zapatistas realmente mexeram com a sensibilidade de um amplo segmento das massas
populares mexicanas”, comentou o cientista político mexicano Eduardo Gallardo, pouco depois da
insurreição, prevendo que suas repercussões seriam de longo alcance, incluindo passos no sentido
da derrubada da longa ditadura eleitoral mexicana. Pesquisas realizadas no país confirmaram esse
ponto de vista, dando conta do apoio da maioria às razões apresentadas pelos zapatistas para a
insurreição. A mesma sensibilidade foi tocada no mundo inteiro, até mesmo nas sociedades
industriais ricas, onde muitas pessoas reconheceram que as preocupações dos zapatistas não eram
diferentes das suas próprias, apesar das circunstâncias tão diversas. O apoio dessas pessoas foi
ainda mais estimulado pelas criativas ações zapatistas dirigidas aos setores mais amplos da
população, visando engaja-los em esforços conjuntos ou paralelos para assumir o controle de suas
vidas e seu destino. A solidariedade mexicana e internacional foi, sem dúvida, fator preponderante
para inibir a brutal repressão militar que se previa e teve um espetacular efeito energizante sobre a
organização e o ativismo em todo o mundo.
O protesto dos índios camponeses em Chiapas é somente um vislumbre de outras “bombas-
relógio” prestes a explodir e não apenas no México.


Boa parte deste artigo foi publicada pela primeira vez em
In These Times, em 21 de fevereiro de 1994.
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