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mem social, ao passo que para Frazer a troca é uma instituição que se
inclui entre outras no interior de uma série evolutiva. Expliquemos me-
lhor este último ponto. O casamento por troca, para Frazer. não é uma
instituição primitiva, mas foi precedida por outras formas de casamento,
tais como a promiscuidade, o casamento consangüíneo e o casamento
de grupo. Pode mesmo somente aparecer quando "a sociedade afastou·
se progressivamente do casamento de grupo ou de formas ainda mais
relaxadas de comércio entre os sexos para se aproximar do casamento
individual". lO' Em segundo lugar. Frazer concebe a troca das esposas
como uma solução cômoda do problema econômico de saber como se
pode obter uma mulher. Afirma várias vezes que a troca das irmãs e
das filhas "foi por toda parte, na origem, uma simples operação de
permuta" ("a simple case of b&.rter"). II Descreve o indígena australiano,
em sua miséria, perguntando como vai poder obter uma mulher quando
não dispõe de nenhum bem material que lhe permita comprá·la, e des·
cobrindo na troca a solução deste problema aparentemente insolúvel. "Os
homens começaram a trocar suas irmãs porque este era o meio mais
barato ("the cheapest way") de encontrar uma esposa"." Esta concep·
ção econômica da troca decorre ainda da conclusão de Frazer, porque
é em última análise a universalidade das leis econômicas que para ele
funda o reconhecimento da conexão necessária entre a troca e o casa-
mento dos primos cruzados. "Porque é de maneira idêntica que, sob
a crosta da selvageria ou da civilização, as forças econômicas atuam
com a mesma uniformidade que as forças da natureza, das quais são
aliás somente uma manifestação particularmente complexa"."
Mostramos constantemente neste trabalho que longe da troca ser
uma modalidade de compra, é a compra que constitui uma modalidade
de troca. É porque Frazer se contentou em atribuir ao seu homem pri-
mitivo a mentalidade do H omo Oeconomicus dos filósofos do século XIX
que fracassou completamente em ver a solidariedade que une a prefe·
rência pelos primos cruzados com a proibição dos primos paralelos.
"Considerado do ponto de vista puramente econômico, diz ele sobre os
dois tipos de primas, não há diferença"." Mas justamente a troca não
deve ser considerada de um ponto de vista econômico. Frazer estabelece
em primeiro lugar a existência de bens econômicos, entre os quais inclui
as mulheres. Verifica que, do ponto de vista econômico, vem a dar exa-
tamente no mesmo trocar irmãs entre primos cruzados e entre primos
paralelos. Sem dúvida, mas com isso· chega assim a um impasse. Nós,
ao contrário, postulamos primeiramente a consciência de uma oposição:
oposição entre dois tipos de mulheres, ou antes, entre dois tipos de re·
lações em que o indivíduo pode estar no que se refere a uma mulher,
quer seja irmã ou filha, isto é, mulher cedida, quer seja esposa, isto é,
mulher adqUirida; mulher parente ou mulher aliada. Mostramos como,
partindo dessa oposição primitiva, constrói·se uma estrutura de recipro·
cidade segundo a qual o grupo que adquiriu deve devolver e o que cedeu
pOde exigir. Comprovamos também que, em qualquer grupo, os primos
lO. Ibid., p. 203.
- Ibid., p. 220.
- Ibid., p. 254.
- Ibid .• p. 220.
- Ibid.
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