354 CARLOS, A FACE OCULTA DE MARIGHELLA
gostava de música, gostava de fazer prosa, piada. Nas reuniões do
partido, ele gostava de fazer desenhos, era muito comum ele fazer
isso aí. Ele era muito engraçado, um gozador.
Edson – Alguma situação específica que você se lembre dele
falando sobre futebol, sobre música.
Salomão – Ele falava tudo isso. Talvez se eu fizer um esforço, mas
uma coisa tão... no meio de tantas outras, que tiveram muito mais peso.
A minha tendência aí é gravar algumas coisas que chamavam a atenção.
Edson – Outra pergunta: por que ele era chamado de “direita”
dentro do partido durante um certo período?
Salomão – Era um negócio de carimbação. O que houve aí é o
seguinte: naquele período, logo depois ficou tudo meio conturbado,
tinha uma luta interna muito forte e digamos assim, de uma maneira
muito esquemática, você podia ver duas linhas de ação. Uma basica-
mente da direção da época, a maior parte, que estava manobrando,
trabalhando no sentido de manter o status quo. Tanto manter uma
forma de afunilar aquilo sem mexer no que estava feito. E, um outro
grupo, ao qual depois o Prestes aderiu, disposto a mudar as coisas,
dizendo: “Não. Não é assim não. Vamos mudar mesmo”. O pessoal
majoritário desse primeiro grupo, inclusive no comitê estadual do
Rio, era o pessoal ligado a primeira área. A tendência deles era olhar
com desconfiança, inclusive quando eu fui para o secretariado, che-
guei a ter na mão, alguns ficaram lá, ainda no tempo do secretariado
do tempo do Marighella, onde tinha pedaços da intervenção dele
grifados exatamente para dar essa ideia de uma pessoa de concepções
equivocadas, erradas, fora da ortodoxia, por aí um pouco. Então,
quando a gente fala “direita” tem um pouco essa conotação. Foi uma
época muito complicada, o partido dividido e Marighella era olhado
como um homem que poderia ser chamado hoje de reformador, estava
aberto para isso. E aí os outros que não eram isso diziam que ele era