Prato Sujo - Como a indústria manipula os alimentos para viciar você! ( PDFDrive )

(Ruy Abreu) #1

da polenta, ele prefere nem lembrar. Não exatamente por questões do paladar,
mas por um trauma de infância.
“Eu estava no segundo ano primário. A professora marcou um piquenique
com a turma para o meio da semana e pediu para cada um levar um lanche
reforçado nesse dia. Mas todo mundo trabalhava na roça, apesar da pouca idade.
Nossa folga era só no domingo à tarde. Fiquei desesperado, me perguntando
‘como é que eu vou passear no meio da semana?’”. A mãe de seu Valmício
morreu de tifo logo depois que chegaram ao Paraná, quando ele tinha 9 meses. E
sua relação com a madrasta também não era das melhores. O pai, que quase foi
levado pela doença, não conversava com nenhum dos 11 filhos. A única coisa
que falava, com o olhar, era que eles tinham de estudar. “Quando tomei coragem
para contar do passeio, na última hora, não dava mais tempo de preparar um
lanche. Minha madrasta pegou um pedaço de polenta e de salame que tinha
sobrado, enrolou em um pano e me deu. Lá fui eu para a escola, já sabendo que
ia virar motivo de piada entre a molecada. Polenta enrolada em um pano? Na
primeira curva da estradinha, joguei tudo fora – e passei o resto do dia sem
comer nada.”
Os anos trouxeram a modernidade para o campo. Quem tinha condições de
comprar sementes melhores e de mecanizar a produção passou a ganhar mais
dinheiro e a comprar os sítios vizinhos. Era fácil perceber que não compensava
mais plantar um pouquinho de cada coisa. O mais rentável eram as monoculturas
de milho, soja e trigo. Ou então desmatar tudo para fazer pasto. Para a família de
seu Valmício, não deu. Eles se juntaram à diáspora rural e migraram para as
cidades, cada um para um canto.


Seu Valmício foi morar em Curitiba, onde fez o ensino médio e arranjou
emprego em uma livraria. Depois mudou para Foz do Iguaçu, onde um tio
morava, e lá trabalhou por mais 32 anos em uma concessionária de carros, até se
aposentar. Hoje, é motorista de profissão – e cientista da vida nas horas vagas.
Alguns sobrinhos dele continuam no campo. Um tem plantação mecanizada de
milho e soja, e uma pocilga. Os animais são alimentados com ração especial para
crescer rápido e criar corpo. “Hoje você precisa ter muito dinheiro para investir e
conseguir lucro. Dez alqueires chegam a consumir R$ 12 mil em sementes para
cada safra.” A relação entre custo e produção é matemática. “As máquinas
plantadeiras de milho são reguladas para soltar uma semente a cada 10
centímetros. Se você programar errado e ela despejar a uma distância maior, vai
ter menos espigas na colheita. Se diminuir o espaço entre um pé e outro, eles

Free download pdf